quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

18 de Janeiro de 1934 - Marinha Grande

Há muito que é conhecido o fervor sindicalista da Marinha Grande e as imensas lutas que os vidreiros levaram a cabo nos anos 80, especialmente, mas nunca soube eu qual a origem deste fervor e espirito de luta.

Até que no Domingo ao almoço o meu pai, vidreiro de profissão e de coração, me falou do feriado do 18 de janeiro.
Desconhecendo eu este pseudo-feriado fui pesquisar e dei de caras com aquela que foi provavelmente uma das primeiras lutas contra o Estado novo.

Fica um extrato de um texto encontrado e um vídeo representativo do acontecimento.

"Para se entender o que aconteceu no dia 18 de Janeiro de 1934, é preciso ir um pouco atrás. Com efeito, a nova Constituição plebiscitada em 1933, dava margem ao Estado Novo para retirar todas as liberdades cívicas aos cidadãos, apoiando-se num texto que, oficialmente, a maioria do eleitorado aprovara. No dia 23 de Setembro desse ano foi publicada a legislação sobre a organização corporativa do trabalho. No que ao universo laboral se referia, a liberdade sindical era extinta, pois só seriam legais os sindicatos nacionais, enquadrados na estrutura corporativa.


Foi criada uma «Frente Única» para fazer face a esta nova ofensiva do estado corporativo no sentido de consolidar a ditadura. As organizações dos trabalhadores, sobretudo a Confederação Geral do Trabalho, dominada pelos anarquistas, defendeu a realização de uma greve geral insurreccional. O PCP preconizou uma estratégia diferente – das assembleias gerais dos sindicatos marcadas para votar os estatutos, deveriam sair moções repudiando a nova legislação, criando-se uma grande movimentação de massas que poderia resultar na tal greve geral projectada pelos anarquistas.
A proposta da CGT prevaleceu e os próprios militantes do PCP envolvidos na organização aderiram à ideia mais radical. Na noite de 17 explodiram algumas bombas: duas em Lisboa e uma em Coimbra. Contudo, no dia 18 de Janeiro, a adesão à greve geral foi decepcionante. Paragens de laboração apenas em fábricas de Almada, do Barreiro e do Algarve.
Na Marinha Grande, as coisas passaram-se de modo diferente. Tudo começou de acordo com os planos traçados – nas fábricas a laboração foi suspensa, cortou-se comunicações e houve manifestações de rua. Depois, a situação alterou-se quando os responsáveis locais, entusiasmados com a adesão maciça da população, resolveram criar um soviete.
Foi eleito um soviete que assumiu o controlo da vila, tomando o posto da GNR e a estação dos Correios. Beneficiando do factor surpresa, tudo foi feito sem derramamento de sangue, decidido passo a passo. À medida que as questões surgiam, iam sendo resolvidas. O comandante do posto da GNR e a sua família foi «aprisionado» numa pensão local. Os guardas ficaram sob custódia de um administrador de uma fábrica. O chefe da estação dos CTT, ao serdetido, pediu para ver a família. Conduzido à residência, aproveitou a conduta benévola dos revoltosos para, telefonicamente, denunciar o golpe às autoridades.
Durante algumas horas, a vila esteve ocupada pelos revolucionários, até que as forças militares que iam chegando os foram cercando, jugulando de forma violenta a revolta. Mais uma vez, o regime capitalizou esta acção, com ela justificando a criação do Campo de Concentração do Tarrafal.
A vila foi cercada por forças militares e, na madrugada de 19, as posições ocupadas pelos trabalhadores foram tomadas e a rebelião jugulada. Seguiu-se o que era de esperar de um regime como o que Salazar instituíra – prisões em massa, interrogatórios acompanhados de tortura, simulacros de julgamentos, deportações para as colónias.
O campo de concentração do Tarrafal foi criado para acolher presos do 18 de Janeiro. Na primeira leva de 152 presos que o foram estrear, 37 tinham participado no 18 de Janeiro. António Guerra, que liderou a ocupação da Estação dos Correios, condenado a 20 anos de degredo, ali morreu em 1948. O ferroviário, militante do PCP, Manuel Vieira Tomé foi brutalmente torturado, vindo a morrer no cárcere em Abril do mesmo ano. Houve centenas de prisões e de deportações."
Nuno Miguel Pedrosa

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